terça-feira, 23 de março de 2010

TCC :)

Sobre o Cemitério do Peixe...

A idéia de fazer o trabalho de conclusão de curso sobre o vilarejo-cemitério perdido no meio do espinhaço, surgiu após a leitura do conto Manuelzão de Guimarães Rosa, que trata em sua estória da construção de uma capela em um lugar remoto do sertão mineiro e de como essa capela gerou uma festa que reuniu inúmeras pessoas de diversos lugares diferentes. Em uma leitura despretensiosa do conto, surgiu em mim uma vontade de buscar um lugar que ainda hoje aparecesse no espaço como tendo sua única função à perpetuação da fé católica popular mineira. Ruy Moreira em seu livro Pensar e Ser em Geografia, trata em um dos capítulos do tema Geografia e Literatura, que me interessa bastante e que trata de observar na literatura as geografias, e geografizar literariamente os espaços.
Com essas idéias em mente, lembrei de um lugar que tinha ouvido falar em meados de 2007, na Lapinha da Serra, no Espinhaço meridional, onde uma senhora me contou de uma romaria que acontece todo mês de agosto, em um lugar chamado Cemitério do Peixe. A romaria de São Miguel e Almas como é conhecida acontece nesse inóspito e desabitado vilarejo fantasma, onde apenas uma igreja, o cemitério, e algumas dezenas de casas vazias, compõem o cenário. Dona Lotinha é a única moradora do lugar, e com sua família cuida da igrejinha e do cemitério, além das casas que ficam vazias ao longo do ano, servindo de abrigo aos romeiros durante a festa. O que me mais me interessou no local foi a principio a estória contada pela tia Claudia da lapinha, sobre o vilarejo. Segundo tia Claudia, o vilarejo fantasma possuía casas que ficam vazias ao longo do ano e são morada das almas das pessoas que foram enterradas no cemitério. A literalização imaginaria do espaço em questão atraiu minha curiosidade e fomentou minha imaginação de modo que aquele lugar tão fantasiosamente descrito, tornou-se fruto de minha pesquisa e trabalho de conclusão de curso.
As poucas informações que a principio consegui adquirir são com base muito mais em algo imaginativo do que concreto, mas com alguns trabalhos de campo e a participação no Jubileu de São Miguel e Almas, pretendo entender, descrever, pensar e repensar um lugar que perdido nas serras de minas, possui um grande valor na vida de inúmeras pessoas. Esse valor não econômico é o que mais me interessa, pois o vilarejo aparece como um lugar-relíquia de valores religiosos, tradicionais da mitologia católica popular mineira.
A principio meu objetivo é descrever e apresentar um estudo sobre como o espaço se organiza, e é organizado durante os dias de silencio e solidão, e a diferença dessa organização para com os dias do jubileu de agosto. Essa pesquisa a principio será voltada a entrevista com dona Lotinha, com os romeiros, e com pessoas da região que já ouviram falar do cemitério e que a principio nunca foram a ele. Quero com isso fazer um mapa psicogeográfico do lugar que aparece mais como ficção do que realidade, e uma descrição do imaginário do povo mineiro extremamente religioso das áreas das serras. Esse mapa seria confrontado com um mapa descritivo real da organização espacial do vilarejo, e com isso demonstrar como a geografia acadêmica e a geografia popular se confundem e divergem em suas descrições. Meu interesse em uma geografia da religião vem desde o inicio do curso, e acredito que o exercício de pesquisa em um lugar que a principio permanece existindo apenas pela fé, será a minha maior realização e aprendizagem no curso de Geografia.
Outro fator que gostaria de levar em consideração sempre em minha pesquisa será a confrontação da literatura com a realidade, e tentar no fim do trabalho escrever um pequeno conto em anexo, sobre a festa, o lugar, e o povo.


Segue agora um pequeno exemplo de como a estória do Cemitério do Peixe é contagiantemente interessante. Irei escrever a estória contada por tia Claudia, mas com o meu próprio entendimento e imaginação.

“Na noite fria no alto da serra do espinhaço, sentado ao redor do fogão a lenha, tomando cerveja e contando causos, ouvi um desses que te deixa perplexadamente interessado em averiguar se o caso é real ou não. Tia Claudia contava de um lugar pras banda do norte da Lapinha, a dois dias e meio de caminha por entre serras e vales do espinhaço, que era habitado por almas. Um vilarejo-cemitério, lugar deserto e vazio, de ninguém passar perto, que possuía apenas uma moradora, uma igrejinha, um cemitério e cem casinhas. Lugar diferente e estranho, como pode haver cem casas e apenas um morador? – perguntava a tia Claudia que ouvia com atenção a minha espantada pergunta.
- Ora – respondeu ela - , as almas dos que foram enterrados ali é que vivem nelas. Para ir lá, tem de se pedir licença as almas, e ai pode-se ficar em qualquer casinha, desde que não se bagunce a casa alheia.
Fiquei estupefato com tal explicação, e quis de toda maneira conhecer esse lugar, aparatemente surgido dos contos de fadas, ou das estórias de terror que ouvia na infância...”

Um comentário:

Ana disse...

Já tá decidido? É esse mesmo seu tema? Espero que sim! Acho que de todos que conheço, voto neste!
Vai ser lindão!
:)