sábado, 1 de maio de 2010

Cemitério do Peixe

É um lugar diferente. Embrenhado no meio das montanhas do espinhaço, escondida e incrustada no meio da mais alta definição da mineiridade, a vila cemitério, espaço sagrado do catolicismo popular, lugar de paz, meditação e respeito, é antes de tudo indefinido. Uma vila temporária. Um espaço que possui uma temporalidade diferente de todos os outros da região. Espaço que se reproduz como espaço social e econômico durante apenas uma semana no ano. Durante o jubilei de São Miguel e Almas em agosto, o vilarejo “fantasma”, vazio de gente, se entope de uma multidão de pessoas. As 3 pessoas residentes no local se transformam em mais de 5 mil, transformando a paz reinante no lugar, no caos da festa quase anárquica. Lugar das almas, a terra não possui dono, e se perguntar a qualquer um do lugar, ele dirá que é das almas. Almas que descansam na maior paz que se pode imaginar, pois o lugar traz a paz da natureza com a segurança e o conforto de uma alteração espacial produzida pelo homem, na forma de uma vila vazia. Por estar vazia, a vila não tem todo o barulho e agitação de uma comunidade humana, e assim traz a quem passa pelo lugar, uma sensação de paz absoluta pois está protegida da perigosa natureza lá fora. Longe do caos dos homens e da natureza, o espaço é mais que um simples e perdido vilarejo na serra, é um espaço sagrado. Sagrado pois traz consigo uma poderosa e viva força baseada numa fé pura e especialmente popular. Traz consigo a força do povo em construir centenas de casas que só terão utilidade uma única vez ao ano. Ainda não conheço a festa, nem consigo imaginar o “peixe”, como é conhecido na região, com um numero absurdo de almas vivas. As mais de 100 casinhas que outrora já foram muitas mais, hoje se modernizam com tecnologias que não são utilizadas por ninguém durante uma infinidade de dias.
A lenda da região diz que o cemitério do peixe, fora em seu inicio, um rancho de tropas, que faziam o antigo caminho que ligava Conceição do Mato Dentro a Diamantina. Durante uma estadia de uma tropa qualquer, um escravo morreu no local, e fora enterrado ali. Logo depois em uma outra tropa que passava na região, um dos tropeiros morreu e foi enterrado no mesmo lugar. Daí fizeram uma missa e ergueram uma pequena capela e um cemitério, transformando o lugar no cemitério para todos aqueles que faleciam na região do peixe. Ninguém sabe dizer o porque do nome ser peixe, mas acreditam ser o fato do rancho ser um lugar que possuía muitos peixes pois era ao lado do rio Parauna, que hoje assoreado, tem grande largura podendo ter sido ate navegável em outras épocas. O lugar é indefinido pois sua historia oral se perdeu nas lendas do povo. Sabe-se que ele existe a quase 200 anos, pois as primeiras memórias e historias vindas dali, provem da época em que a corte estava na colônia. O Brasil se tornou independente , virou império , republica e agora vive no caos do desenvolvimentismo, e o cemitério do peixe pouco mudou. Os antigos já diziam que bom mesmo era o cemitério antigamente, e assim por inúmeras gerações passadas o cemitério vem sendo utilizado, e o jubileu de São Miguel e Almas acontecendo. O silencio ensurdecedor do lugar, define o que ele é. Um lugar vazio, mas vivo. Cheio, mas vazio. Distante da realidade mundana, mas perto da mais pura religiosidade que se pode atingir. Fé e paz são sentimentos que o homem atinge em locais e em eventos diferentes, mas no peixe eles são constantes.
Anseio ver a festa e a total mudança do espaço, quero poder ver com meus próprios olhos essa cidade, agora fantasma, se tornar o centro da região.


Se alguém quiser conhecer um lugar interessante antes de morrer, indico que conheçam o Cemitério do Peixe...

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