Dia quente na Bhbilônia, e
não há nenhum lugar onde se possa ir para se refrescar. Talvez um shopping com
ar condicionado, mas se eu não quiser comprar, o que fazer lá!? Em meio a crise
de abstinência de natureza, decidi me aventurar em atravessar a metrópole e
subir na Serra do Curral que emoldura a bela capital nas montanhas. Mas ao
chegar no Parque que fecha as 17h da tarde, me indignei de tal forma, que
resolvi burlar qualquer tipo de proibição e pulando a grade que cerca e impede
que as pessoas subam na serra, embrenhei no mato e fui subindo até onde deu. Do
alto, isolado do caos lá embaixo, sentia dó e pena de todas as milhares de
pessoas que estão presas em algum tipo de ambiente fechado, como escritórios, e
veículos motores. Individualizados em suas vidas de escravos, contabilizados
pelos donos, os pobres homens bhbilônicos sofrem ao deixarem o trabalho com
destino às senzalas tecnológicas que como morfina, tiram-lhes parte da dor.
Vendo o magnífico por do Sol, do alto da serra, sentindo o friozinho de
montanha cortar o corpo, desci os cinco quilômetros que separam a base da serra
do Curral ao centro belorizontino, e me embrenhei em bares quentes, cheio de
gente em busca de uma fuga da caoticidade lá fora nas ruas. Não há como ir
embora entre 18h e 20h, então uma cerveja gelada no templo maior do Maletta, e
o tempo passa e a gente nem vê; Mas sente, e sente o peso do valor real da
cerveja, do custo do deslocamento, do cansaço do esgotamento diário com o caos
no transito, no trabalho e no lar. E sem lugar, só o bar salva o belorizontino
que passa a vida em busca de embriaguez. Diriam em outro lugar que isso é
alcoolismo, mas na nossa cidade se diz cultura. Capital dos bares, elogiada em
todo lugar por isso, cobra caro pelo que vende, e oferece pouco. E seguindo em
busca de uma cerveja mais barata, tem de se descer até o nível mais baixo do
centro, na várzea do Arrudas, e ali na Guaranis com Tupis, as clássicas tribos
brasileiras, encontra-se a salvação do preço. Na Cantina Serrana, desses bares
do centro, com balcão retangular com cadeiras altas, a maioria das pessoas ali
não são belorizontinas, vieram do interior, e como no interior têm o admirável
costume de ficarem “bicudas” até altas horas para dormir cambaleantes de sua
condição. Um prato de angu com feijão, levanta qualquer um, e um tiozinho que
já ia pela 11ª cerveja em sono induzido pelo álcool, acorda de vez, paga a
conta e na ultimas energias consegue ir embora. Eu ali no abafado e quente
espaço, vejo que as atendentes eram todas mulheres, e que 95% dos clientes
homens. Um entrevero de gênero, e as atendentes são fulminadas a todo instante
por olhares maliciosos, outros até carinhosos, mas todos machistas. Estressada
de tanto ser olhada, uma das atendentes começa a descontar toda sua
insatisfação por estar naquele meio, na colega ao lado, que mal consegue se
desvencilhar de tantos chamados. É o caos constante dos bares, os esbarroes e a
fila para ir ao banheiro. E no meio disso tudo, uma paixão gigante me apoderou,
uma vontade de dizer que a atendente que havia me servido a cerveja era linda
demais e que não devia estar ali. Queria leva-la para outro lugar para que ela
pudesse não mais trabalhar e só divertir, mas a síndrome do príncipe encantado
logo passou, e voltei minhas atenções para as divertidas estórias que ao meu
lado um senhor tagarelava. E eu ali no ambiente de bar, lugar sagrado para o
belorizontino sem mar, ria em gargalhadas sem percebe o quanto já me
embriagara. Horas e horas depois, deixei o lugar rumo à casa dos amigos que
como uma base central no centro, me acolheram no fim da noite. Cidade sem
lazer, faz com que o beber seja a solução, e refrescando o corpo por dentro, e
divagando sem condição, seguimos odiando o sistema, a cidade, o caos, e ao
mesmo tempo amando tudo isso. Porque se nós restou o álcool como fuga, com o
álcool fugiremos. Enquanto os parques estiverem fechados, os bares triunfarão.
ESCRITO DIA 10/09 - 5 dias antes da Noite Branca