quinta-feira, 26 de maio de 2011

Sob a lei do $ifrão.

Estamos no começo da segunda década do século XXI, e ainda cometemos os mesmo erros do século XX. A questão Belo Monte é algo muito mais sério do que se imagina, porque ela está inserida num contexo muito complexo. Vou tentar escrever aqui o meu entendimento do que está acontecendo por aqui e o que é possível pensar sobre toda essa historia.

Belo Monte é uma das mais complicadas questões atuais no país porque envolve antes de tudo o enriquecimento de poucos em detrimento de uma imensa área de selva, de uma grande população, tanto silvícola quanto ribeirinha, além de toda a problemática energética nacional. Aqui em meio ao Xingu, nas densas matas que contornam a Grande Volta que esse majestoso rio faz, estive conversando com algumas pessoas na Vila Ressaca, a pequena favela capital da região. A primeira coisa a se constatar dessa conversa é que as pessoas estão, antes de serem a favor ou contra Belo Monte, perdidas. Elas mal sabem o que vai acontecer, como vai acontecer, só sabem de uma coisa. Elas irão perder.

O Consórcio Belo Monte vem usando táticas e métodos diferentes para comprar as pessoas. Na quarta passada, ocorreu um show em Altamira, patrocinado pelo Consórcio com Banda Calypso e sorteio de 11 motos. Outra tática incrivelmente contraditória foi a de levar placas solares para captação de energia e assim levar luz a casa dos ribeirinhos. Isso é uma coisa tão surreal que ainda não acredito, mas muitas pessoas me disseram que de fato isso ocorreu e vem ocorrendo. Ou seja a Norte Energia traz a solução mais prática aos moradores, para que eles sejam favoráveis a construção da barragem, e ai na cabeça do ribeirinho nada mais faz sentido. Ora, se ele tem já a luz, porque precisa da barragem? Fica nítido sim que essa energia não é para ele, e sim para aqueles que vão se tornar bilionários.

Nem vou tocar no âmbito do meio ambiente porque isso está mais que claro que é uma burrice. Muito menos no âmbito do silvícola, já que há muita gente discutindo isso, vou trazer a tona o assunto que mais me encabulou que é o referente aos moradores da região, a questão da terra, e da moradia. Bem a Vila Ressaca, é a principal de toda a região e ela não passa de um mero amontoado de casas seguindo uma rua principal, e duas travessas, com uma escola, diversas vendinhas, alguns cabarés e botecos. O lugar foi construído pelos garimpeiros da região, que antes moravam nos seus barracões isolados próximos as áreas de garimpo, mas que com o tempo, como iam sempre a Ilha da Fazenda, povoado ribeirinho em uma ilha próximo a vila, vender o ouro e gasta-lo no rock, resolveram construir a sua própria vila e fixaram-se ali. Conversei hoje com um dos primeiros garimpeiros da região. Ele vem buscando o direito de suas terras, mas, MASSSSSSSSSSSSS, ele que chegou em 1958, e que em 1963 entrou na justiça com a papelada, até hoje, passados 48 anos, ainda não recebeu os papeis que comprovam que as terras deles são realmente dele. Aposentado de anos do garimpo vive de uma pequena venda, e é um dos principais homens da Vila Ressaca.

Esse senhor teme uma coisa, que ninguém nem sabe que vai rolar. As pessoas que forem retiradas para a construção da barragem, mesmo as que moram próximas de Altamira, NÃO irão para Altamira e sim para a Vila Ressaca. Ou seja, centenas de ribeirinhos que não terão mais o rio para pescar, vão se mudar para uma favela sem posto de saúde, sem policiamento, quase sem educação, entregues a lei do cifrão, que manda aqui nesse remoto posto de garimpo do meio da Amazônia. O preço da terra em Altamira subiu drasticamente de 2 anos para cá, e agora vem aumentando cada vez mais, por isso é mais barato para a Norte Energia, economizar levando o povo para uma favela isolada numa remota curva do rio, do que leva-los para uma cidade já com mais de 100mil habitantes. É tão ridículo toda a coisa, que imaginem vocês que a vila Ressaca, não deve ter mais de que 500 habitantes, e de repente irá dobrar sua população. Ai volto na questão do velho garimpeiro que diz: E ai, e meu direito da terra? O povo já começou a se mudar, e vão invadir tudo aqui, aumentando mais a confusão que já é. Sem conhecimento de nada, o povo acaba também sem direito a nada, e ai vão cair na mão das piores pessoas do lugar, que vão alugar seus barracos, e até vender terras que nem são delas, com papel falso.

A Norte Energia diz que vai asfaltar, levar saneamento, educação e saúde para a vila Ressaca. Dizem isso sempre com o maligno argumento do Progresso. Mas é ai que a contradição pipoca na cara de todo mundo. O dito progresso, só é progresso quando é algo bom e inteligente, fora isso é RETROCESSO. E o que o Consórcio Belo Monte está fazendo, é aglomerar pessoas que se viam livres, em um inferno de madeira e telhas de amianto, no calor amazônico, cercado de doenças que proliferarão com o rápido aumento da população. O que o pessoal da Ressaca mais pede, é que eles tenham pelo menos um apoio jurídico, para que eles possam regularizar a terra, ter acesso ao direito comum de todo cidadão. E isso não acontece porque quem faz as coisas fora da lei é o próprio Consórcio, que tira as pessoas na TORA de suas casas, e as levam para um lugar que elas nunca deveriam ir. O velho garimpeiro cansou de esperar a justiça, e sabe que só vai conseguir os papeis com o direito da terra com o suborno. A policia também só aparece na vila para cobrar o bicho, e saem rapidamente. Não existe posto de saúde e a balela contada para a população já começa a se fazer clara. O povo sabe que não vai melhorar em nada sua vida, mas queriam pelo menos dignidade. Mas isso o Consórcio não quer dar. Pra eles são apenas meros ribeirinhos ignorantes e quase selvagens. Me lembra até um certo Pizarro.

A Norte Energia reformou uma escola na cidade de Belo Monte, construíram uma sala, e fazem em cima disso uma enorme propaganda. Quem me disse isso, foi uma senhora que mudou de lá porque tudo começou de repente a inflacionar por causa da obra. As pessoas estão tão perdidas que o motora que tá comigo aqui, que é de Altamira, mal sabe se a casa dele vai ser alagada ou não pela represa, e ai não pode vende-la agora e procurar uma outra. Vai ter que esperar mais e mais, até que quando ficar sabendo, o valor da terra vai estar tão alto que ele não vai ter mais condições de comprar outra casa. A Norte Energia, vem fazendo outra coisa que é uma cretinagem enorme. Estão dando para as famílias que estão sendo retiradas, cerca de 50mil reais. Bem 50mil reais na minha mão é uma coisa, mas na mão de pessoas iletradas, sem ajuda jurídica, sem conhecimento de nada, que nunca viveram na cidade, é como dar uma caixa de chocolate a uma criança. Em 2 horas a criança vai estar muito feliz, vai mostrar pra todo mundo, até dar um bombom para os amigos, mas rapidamente a caixa vai acabar, e sem ter mais o que comer, vai sentar e chorar. É isso que essas familias vão passar, com 50mil na mão e sem ajuda de ninguém. Entregues a própria sorte, vão ser roubadas pelos novos bandidos que vão surgir na região, sem trabalho, tentando a sorte de qualquer modo na selva humana.

É uma grande imbecilidade a construção dessa barragem em pleno século XXI, e injustificável como algo que trará progresso. Progresso no séc.XXI é um tanto quanto diferente do progresso do século XX, onde erramos demais. Temos tecnologia, temos inteligência, temos leis que podem levar a uma real progresso em educação, saúde e qualidade de vida para os moradores daqui. Não uma barragem irracional, pensada no governo mais imbecil que já passou por essas terras, isso na longínqua década de 70. Faz sentido seguir com um plano iniciado em uma era tão diferente da nossa? Temos todos os argumentos para evitar essa tragédia, mas nenhum para ser a favor. Nem mais a baboseira do progresso cola, porque o real progresso seria inovar em tecnologia de energias limpas, e não e alagar uma enorme área de floresta tropical, para enriquecer uns filhas da puta por ai.

Bem uma ultima coisa e essa digo a todos que estão com a bundinha sentada em frente ao computador achando muito paia Belo Monte e repassando emails sendo contra. Na boa se quer mudar algo, saia daí e venha até aqui. Porque aqui a coisa é diferente. Aqui a lei do $ tá comendo solta, pode quem tem, respeita quem tem juízo. Eu aqui sou apenas um pássaro que voa baixo e que é facilmente abatido por um estilingue. Mas se uma revoada inteira se dirigir praqui ai sim iremos mudar alguma coisa.

Pense então no progresso, e em qual “progresso” iremos seguir. Pense então no que fazemos para mudar alguma coisa. Eu to aqui pensando em como agir, ainda não desisti, espero que não.

Abraços a todos das montanhas gélidas ai nas Gerais!

2 comentários:

Anônimo disse...

Colé doido! Vou te passar meu currículo procê me indicar presse trampo muito doido, aí vou dar uns razantes por aí também. Toma cuidado pros coronér do capital num te identificar como subversivo e te passar na linha do facão. Abraço maluco, te cuida.

balewhi

Mourelis disse...

Oi Oliver,
quando vi o link para esse post no seu blog já sabia que iria me deparar com um bom texto e uma realidade ruim.

Como vc afirma, é nítido que o ponto de vista e o discurso partindo desta localidade, possui melhor consistência (por mais que eu também compactue, afirme e reafirme questões como "Progresso no séc.XXI é um tanto quanto diferente do progresso do século XX, onde erramos demais." e "o real progresso seria inovar em tecnologia de energias limpas, e não e alagar uma enorme área de floresta tropical, para enriquecer uns filhas da puta por ai".)

Em relação à tudo isso e tudo mais, abrangendo existencialidade e o caralho a quatro, desfassámos a costura dos valores e crenças, fés e utopias, para destacadamente, fazermos a diferença.

A celebrização e virtualidade de um mundinho que dáspareza ao mundão, são inimigos em casos re-emergentes como a Amazônia brasileira. O Brasil é o totem, o tabu, o engano e o desenagano do Brasil.

Enfim, esse comentário serve mais para elogiar seu texto, parabenizar pelo seu trabalho realizado aí (do qual gostaria de saber mais) e mandar forças para ti!

Só mais uma coisinha, acho que há um engano de escrita no trecho: "E isso não acontece porque quem não faz as coisas fora da lei é o próprio Consórcio, que tira as pessoas na TORA de suas casas, e as levam para um lugar que elas nunca deveriam ir."

Um abraço