terça-feira, 8 de novembro de 2011

Varzear

Varzeava pela cidade, em busca de alegria e felicidade oferecidas pelos bares das paralelas e transversais ruas belorizontinas centrais. Sem sinal de cansaço, utilizando do ato de se embriagar mais e mais, para no fim em contida demência, cambalear pelos pontos de ônibus, dando aleatórios sinais para que algum motora parasse e me levasse embora. Longe de qualquer estresse o varzeano perambula pela várzea até que encontra na movimentada avenida comercial, sombria e vazia sob a luz laranja, um churrasquinho de rato que aqueles homens caçaram pela tarde. Um gole num latão molhado de uma água fria, não refresca nem mata a sede, só aumenta o enjôo que seu fígado em quase morte produz para lembrá-lo que antes de ser um sujeito varzeano, ele é um ser humano, bicho que sofre por saber que pode sofrer. E anda em ziguezague desviando dos falsos vultos que só ele vê, em um descontinuado passo de quem não quer crer. Crer ou não crer, eis a questão, e foi isso que me perguntaram no banco do busão quando voltava pra casa em sonolenta depressão. Era um crente demente, sem instrução, que berrava lá na frente que só Jesus é a salvação. Em relapso de sono, levantei e dei sinal, pedindo pro motora parar ali mesmo, pois meu fígado estava mal. Desci na borda da várzea, antes de sair do centro em direção de casa, e caminhei até um bar que jazia aberto entre bêbados e pedretes. Uma puta me ofereceu prazer, mas queria era um chá de boldo gelado para beber. Pedi água torneiral pois não tinha mais nenhum real, e encostado no balcão do bar, cochilei sem perceber. Acordei assustado com um tapa no ombro de um amigo que chegava ali quase no amanhecer. Disse pra mim que tava rolando um rock na casa de um amigo e me chamou para ir lá com ele pra ver, eu acordei em cambaleio, deslizei sobre o passeio e nem vi como lá cheguei. Só sei que subi as escadas, atravessei uma porta e adentrei o apê, que estava cheio de gente que mal conhecia, bebiam e fumavam num constante entorpecer. Avistei um sofá, e logo fui me deitar para ver se parava de girar o mundo que custava para entender. Minha coluna me agradecia por estar ali deitado, mas meu corpo estirado, só me causava sofrer. O dia ia amanhecendo, o centro se remoendo em apressado trançar de gente a correr, atrasados pro trabalho onde o chefe os esperava para dar o que fazer. Alguém me ofereceu café, mas era um migué, pois era catuaba com mé, difícil de descer. Um gole e tudo foi por agua abaixo, morri de cansaço depois de vomitar até morrer. Duas horas depois, em plena terça feira, eu desci tentando ir embora, pois o varzeano não agüenta quando o Sol começa a ferver. Desci pro ponto errado, mas ai aparece o acaso para me salvar de tanta loucura naquela noite que já era dia. Meu ônibus havia desviado, por motivo de batida em outra parte do centro, vindo diretamente a meu encontro me levar pra casa sem ao menos eu entender. Acordei no meu bairro, com a cara na janela, não havia resistido ao sono e quase do ponto eu passei. Quando avistei minha cama, tão quentinha e bacana, orei e rezei ao deus da várzea por mais um dia de culto a transcender. É que essa vida é marvada, mas é boa quando se descobre que não há motivo para se viver. E eu ali depois de descer do D, não sabia se era sonho o realidade, mas sei que em algum lugar dessa cidade, embaixo de ruas e avenidas, há rios a correr.

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